quinta-feira, 13 de junho de 2019

A autorregulação das emoções na primeira infância


A primeira infância, do 0 até os 6 anos, é uma fase intensa de aprendizados através das experiências e dos exemplos. Tudo que for aprendido nesta fase se tornará a base emocional da vida adulta desta criança.

Cientificamente já foi comprovado que que as emoções e os sentimentos dos pais são transferidos para o bebê ainda no útero: tristeza, raiva, amor e culpa que os pais sentem também são sentidos pelo bebê. É a partir dessas experiências uterinas até os sete anos de idade que o indivíduo desenvolverá seus programas emocionais e podem se refletir por toda a vida adulta do indivíduo. Portanto, a decisão de gerar uma criança já inicia um processo de educação emocional sua e consequentemente, da sua criança também.

Existem vários estudos que sugerem que crianças com depressão não empregam de maneira eficiente estratégias de regulação afetiva (Asarnow, Carlson, & Guthrie, 1987; Borges, Manso, Tomé, & Matos, 2006; Burwell & Shirk, 2007; Li, DiGiuseppe, & Froh, 2006; Miller, 2003). A autorregulação das emoções é o termo usado para definir os processos envolvidos na forma de lidar com níveis elevados de emoções positivas e negativas. Portanto, é preciso ensinar às nossas crianças a autorregulação; equilíbrio é a palavra de ordem, na educação emocional.


A criança precisa ser ensinada à regular suas emoções, ou seja, criar estratégias de enfrentamento que procurem diminuir a sensação física desagradável diante da situação estressante, bem como modificar o seu estado emocional.  Numa visão cognitiva baseada na Teoria do Processamento da Informação, Garber, Braafladt e Zeman (citados por Boruchovitch, 2004), propõem um modelo para o desenvolvimento da autorregulação afetiva, em que sugerem algumas etapas para um controle eficiente das emoções.São elas:

1°) Perceber o surgimento da emoção: muitos de nós chega à idade adulta sem conseguir perceber o momento em que surge uma emoção dentro de si; quando nos damos conta, já estamos engolfados em um turbilhão emocional, um tsunami que nos engole e domina nossas ações.
É importante que a criança seja ensinada a olhar pra dentro de si mesma, identificar que tipo de emoção está se sentindo e perceber a sua intensidade. Isso permitirá que avalie a necessidade ou não de controlá-la.
2º) Identificação da causa da emoção:  é importante que a criança procure identificar a causa de sua emoção para avaliar a situação e assim poder definir que tipo de ação é adequada para aquela situação.
3º) Levantar possíveis respostas para cada ação pensada na etapa anterior: isso permitirá que a criança coloque em ação a empatia que é a competência de se colocar no lugar do outro. À cada emoção sentida há uma resposta do indivíduo. Essa resposta pode ser automática, quando se deixa levar pelo calor da emoção, ou pode ser autorregulada, quando segue as etapas descritas até aqui, permitindo que você mesmo esteja no comando de sua vida.
4º) Por fim, avaliar o desempenho das decisões tomadas: após as etapas anteriores, ou seja finalizada a situação que desencadeou a emoção e suas respostas, é preciso parar para refletir o que deu certo e o que não deu certo. Assim, para uma experiência semelhante já saberemos o que funciona e o que não funciona.

Capacidade de auto-regulação das crianças por idade



- Por volta  de 2 anos as crianças começam a entender que outras pessoas têm emoções e pode ser diferente da sua.
- De 2 a 3 anos começa o período de "independência". É uma fase egocêntrica, baseado nas palavras "eu" e "meu", exigindo que o adulto "não ajude". É neste período em que eles começam a responder por boas ou más escolhas (formar julgamentos) e onde a auto-regulação das emoções faz com que a criança comece a julgar a si mesmo.
- Aos 5 anos, esta capacidade de auto-regulação é mais desenvolvida e a complexidade entre as emoções, crenças e expectativas aparece. Ou seja, as crianças começam a relacionar a sua capacidade cognitiva com as emoções.


Dicas para ensinar o auto controle em crianças

  • Nomeie os sentimentos: quem deve ensinar os nomes dos sentimentos para as crianças são os pais ou a sua referência educadora, seja uma avó, um irmão ou um tio. A criança precisa saber nomear o que está sentindo para poder se expressar e colocar em prática as etapas de autorregulação descritas anteriormente. Num próximo post falaremos especificamente sobre os sentimentos básicos e os gerais.
  • Mostre empatia: procure não avaliar ou julgar os sentimentos e as reações de sua criança. Para isso, exercite a empatia, pois ele estará aprendendo com você a ser empático. Procure se colocar no lugar da sua criança para entender o que ela está sentindo e demonstre que se importa com seus sentimentos ouvindo-o falar sobre eles. Busque criar momentos para que esse diálogo surja, podem ser jogos, brincadeiras de esconde-esconde que despertam emoções mais fortes e vívidas, enfim, crie situações em que a criança possa sentir emoções para que você exercite a empatia com ela.
  • Estabeleça limites de comportamento aceitáveis: seguir regras é difícil para nossas crianças, mas a paciência e a persistência nessas regras, nos primeiros anos de vida são fundamentais para que ela aprenda, na prática, as estratégias de autorregulação emocional. Para isso, não espere que ela aprenda a falar para poder estabelecer regras. A criança entende desde os primeiros anos de vida, quando instintamente puxa seus cabelos e você gentilmente a ensina as primeiras regras: passando a mão do bebê sobre seus cabelos como uma carícia e dizendo docemente palavras que a encorajem a continuar com ações carinhosas.
  • Ensine-o a resolver o problema: é uma tendência dos pais quererem resolver tudo para seus filhos. No entanto, isso é muito prejudicial pois, você o impede de vivenciar situações maravilhosas para exercitar os passos da autorregulação emocional. Leve-o para parques públicos, onde terá contato com o maior número de crianças possível, onde os conflitos surgirão e lhe darão excelentes oportunidades de colocar em prática quase todos os passos da autorregulação emocional.
  • Dê o exemplo; mantenha-se calma: você já sabe, o exemplo arrasta muito mais do que as palavras.
  • Ensine-o a reconhecer os sinais: Peça-lhe que identifique suas emoções à partir dos sinais fisiológicos do corpo - suores, tremor, calor nas faces, frio na barriga, estômago encolhido, arrepio dos pelos do corpo, etc. Tudo isso sua criança sente mas, quem vai ensinar-lhe a dar nomes e entender o que se passa é você, a referência educadora dela.
  • Ensine-o a se acalmar: existem inúmeras estratégias de relaxamento no google. Mas, sem dúvida, a básica é o exercício respiratório. Nas primeiras birras, abraçar o seu filho e falar palavras doces de conforto ("estou aqui", "respire", eu estou com você", "eu lhe entendo", "eu amo você") já são estratégias de relaxamento desde a mais tenra idade.
  • Ensine-o a liberar a sua raiva de forma positiva: ensine seu filho que sentir raiva é normal à qualquer ser humano. O que não é normal é dar vazão à essa raiva de forma destrutiva. Um jogo tão simples como soprar bolhas pode estimular o autocontrole na criança, ajuda a regular as respostas impulsivas da criança através da sua respiração, produzindo um efeito muito semelhante ao obtido com a técnica de respiração diafragmática. Sem contar que ao soprar as bolhas ao vento, sua raiva se dissipa junto e ele voltará à sorrir, descontraidamente.
  • Peça ajuda quando ficar nervosa: uma coisa que aprendi com minha filha foi pedir a sua ajuda para que eu mesma pudesse colocar em prática os passos da autorregulação. Como eu mesma me deixava levar pelos impulsos das emoções, eu pedia que ela me ajudasse me avisando que eu estava ficando muito nervosa, caso eu mesma não percebesse. Isso deu muito certo porque desde pequenina ela entendeu na prática que pais e mães não são super Humanos e que também precisam de estratégias de autorregulação. Eram oportunidades excelentes de colocar em prática a empatia, os exercícios respiratórios, os jogos de relaxamento, e tudo mais que eu criava para que ela pudesse se autorregular. 

    Queremos que as crianças tenham os seus sentimentos, mas que não sejam dominadas por elas. As crianças que são capazes de regular suas emoções prestam mais atenção e conseguem um melhor desempenho escolar. Elas são mais capazes de resolver os conflitos com seus pares e mostram níveis mais baixos de estresse fisiológico. Sendo também mais comportados, e mais solidária para com os outros.

    Num próximo post colocaremos alguns jogos e brincadeiras que ajudarão você e sua criança à colocar em prática e desenvolver as estratégias de autorregulação explicadas hoje por aqui. Se inscreva no blogue para ser avisado sobre os novos post, no seu email, assim você não vai perder nenhuma dica preciosa. Até a próxima!!

    REFERÊNCIAS

    Asarnow, J. R., Carlson, G. A., & Guthrie, D. (1987). Coping strategies, self-perceptions, hopelessness, and perceived family environment in depressed and suicidal children. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 55, 361-366.

    Borges, A. I., Manso, D. S., Tomé, G., & Matos, M. G. (2006). Depressão e coping em crianças e adolescentes portugueses. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, 2(2),73-84.

    Burwell, R. A., & Shirk, S.R. (2007). Subtypes of rumination in adolescence: associations between brooding, reflection, depressive symptoms, and coping. Journal Clinical Child and Adolescent Psychololy,36(1), 56-65

    Li, C. E., DiGiuseppe, R., & Froh, J. (2006). The role of sex, gender and coping in adolescent depression. Adolescence, 41(163), 409-15.

    Miller, J. (2003). O livro de referência para a depressão infantil (M. M. Tera, Trad.). São Paulo: M. Books

    Boruchovitch, E. (2004). A Auto-regulação da aprendizagem e a escolarização inicial. In E. Boruchovitch & J. A. Bzuneck (Orgs.), Aprendizagem: processos psicológicos e o contexto social na escola (pp. 55-88). Petrópolis: Vozes.      

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